28 janeiro 2007

Senhoras

Eu, de férias em uma cidade histórica de Minas, tomava um café solitário em uma tarde de montanhas no horizonte, quando...
Três senhoras tomavam chá em uma bonita varanda. Uma delas, muito elegante e de modos delicados, trajava um vestido de seda estampado, muito bem cortado, e calçava sapatos scarpins. A segunda tinha um sorriso largo e olhinhos pequenos e muito ágeis, nos quais podíamos enxergar um pouco da menina levada e da moça impetuosa que devem ter, há tempos, possuído aquele olhar. A terceira parecia ser a mais velha das três. O que primeiro se destacava em sua aparência era seu cabelo muito branco e macio, que dava vontade de tocar.
Fiquei imaginando o que conversavam alegremente estas três senhoras, e fui ficando com uma imensa vontade de poder escutá-las, principalmente porque a cada relato de uma delas, as três caíam em uma gargalhada uníssona.
Quando dei por mim, havia chamado o garçom e, inventando uma desculpa, pedi que mudasse de mesa para uma mais próxima à janela, pois “gostaria de ficar observando a paisagem”. Minha curiosidade tinha sido maior que meus princípios de boa educação, e eu consegui me sentar bem pertinho, de costas para elas e com meus ouvidos bem abertos. Na minha nova condição de ouvinte indiscreta, pude perceber que, com muito bom humor, elas contavam os últimos casos de “lapsos” que cada uma delas havia passado. A senhora dos olhinhos pequenos, que eu batizei de Senhora M., foi a primeira que eu pude ouvir:
“Outro dia, peguei um ônibus no centro para ir visitar minha filha. Quando dei por mim, estava indo para o lado oposto ao qual eu desejava. Com certeza, havia entrado no ônibus errado. Então fui até o motorista e pedi que me deixasse descer, pois ainda daria tempo de voltar ao ponto e pegar o ônibus certo. Mas ele, impassível, disse que só pararia no próximo ponto, que ficava mais ou menos a umas dez quadras de distância. Todos lá em casa andam reclamando que tenho falado em um tom altíssimo. Eu percebi que todos no ônibus tinham ouvido meu pedido quando um negão de uns dois metros de altura e quase da largura do corredor levantou-se do último banco e bateu pesadamente a mão larga nas costas do motorista: _ Escuta aqui, tu vai pará o ônibus pra vovó descer agora, ou então vai ter que acertar as contas é comigo!
O motorista freou na mesmo hora. Eu tremia de medo, mas me senti a donzela daqueles filmes antigos sendo salva pelo herói. Agradeci o negão e saí toda faceira, cabecinha empinada e olhar leve...”
A senhora de cabelo branco interrompeu:
“Até que um pouco de surdez às vezes ajuda, né?” E então iniciou seu relato: “Meu caso em um ônibus foi ainda mais tragicômico! No fim do ano passado, fui fazer compras de natal com minha filha no centro da cidade. O ônibus começou a se encher de gente ainda em nosso bairro, e eu consegui um lugar na frente, enquanto minha filha foi sentar-se lá no fundo, quase na porta de saída. Quando dei por mim, já estávamos quase no ponto onde deveríamos descer. Tentei alcançar a campainha, mas era muito alta pra mim. Então gritei para minha filha lá do outro lado: _ Ana Maria, ôõô Ana Maria, aperta a descarga que nós já vamos descer! O ônibus inteiro caiu na risada, e quando a porta se abriu, eu me senti o próprio cocô descendo pela água da privada!
Ficamos ali, eu e minha filha, apoiando uma na outra de tanto rir, até que conseguimos um pouco de tranqüilidade para nos movermos.”
A última a falar foi aquela mais chique, que eu apelidei de Senhora L: “Minhas queridas, eu só vou contar minha história porque, depois destes dois relatos, eu não irei me sentir a mais caduca das três! Quando eu morava naquela pequena cidade do interior, costumava pegar um ônibus para visitar parentes na capital. A rodoviária da cidade compunha-se apenas de uma pista cercada por duas calçadas. De um lado era o embarque e do outro o desembarque. Meu marido foi até lá me acompanhar até que o ônibus embarcasse. Eu estava ansiosa por ter que viajar sozinha, eu não gosto! Sempre viajei com meu marido. Esperei do lado de fora até o último segundo, conversando com uma parenta que por lá encontrei. O motorista, parado de fora do ônibus e ao lado do meu marido, fez sinal para que os últimos passageiros entrassem, mas eu era a única que ainda estava fora do ônibus. Na pressa de entrar troquei as bolas, entreguei a passagem para meu marido e dei um abraço apertado no motorista! Só me dei conta da troca quando já tinha estalado um beijo na bochecha dele! E pra piorar a situação, a minha cadeira era a de n° 3, a primeira do lado contrário ao motorista. As quatro horas de viagem pareciam que não iam terminar nunca mais. Além das risadinhas dos passageiros que tinham presenciado a cena, o motorista passou a metade do trajeto me encarando pelo retrovisor!”
Neste momento eu, que já estava suando para conter meu riso, não agüentei mais e debrucei-me sobre a mesa, de tanto rir. Tive que pedir desculpas às senhoras, que acabaram por me convidar para sentar-me com elas, o que eu recusei mais por educação e menos por vontade.
Naquele dia, aprendi uma regra importante para bem viver: NUNCA PERDER A CAPACIDADE DE RIR DE SI MESMA!

Quem, nesta vida, é totalmente livre?

"Já quebrei meus grilhões, dirás talvez. Também o cão, com grande esforço arranca-se da cadeia e foge. Mas, preso à coleira, vai arrastando um bom pedaço da corrente."

PÉRSIO, Sat. V, 158

24 janeiro 2007

Modernidade escravizante

Duas amigas conversam durante o trabalho. Uma é Sara, 25 anos, muito religiosa e tradicional, casada desde os 16 anos com Antônio. A outra é Malu, 24 anos, que tem suas próprias crenças, é solteira e se diz liberal.
_ Sara, ontem eu saí com aquele carinha que eu estava suuper a fim...
_ Qual, o Beto?
_ Não, amiga, o Paulinho, aquele loiro lindo!
_ Garota, cruzes! Você não tava saindo com aquele moreno?
_ É, o Saulo. Mas não deu certo, sabe? Eu ainda estou procurando o príncipe encantado, minha alma gêmea, aquele que nasceu só pra mim! Ei, Sara, me conta como você achou o seu...
_ Foi facil, amiga. Os pais do Antônio moravam na mesma rua e a gente frequentava a mesma igreja desde criança. Um dia ele me pediu em namoro e 8 meses depois nos casamos.
(Malu rindo)
_ Mas como você tinha certeza que ele era o "homem da sua vida"? Você já tinha namorado muitos antes dele?
_ Não, na verdade nenhum.
_ Mas um "rala e rola" vocês tiveram, é lógico que você experimentou antes, como poderia ter certeza?
_ Que é isso, eu me casei Virgenzinha da Silva! E sempre soube que era com ele que eu queria passar toda minha vida. E não me decepcionei nadinha, adoro rolar com ele mesmo depois de quase 10 anos casada.
_ Como pode?!? Isso nunca aconteceu comigo. Será que é azar? Praga? Mau olhado? Já saí com mais de trinta caras e nunca senti esta certeza com nenhum deles.
(Agora Sara é quem ri)
_ Não sei, mas foi assim que aconteceu.
_ Olha, Sara, você tem que me ajudar! Diga, você nunca teve vontade de experimentar outro, só pra ver como é que é?
_ Vontade eu posso até ter, mas vale a pena não... meu casamento é bom e eu tenho muito prazer com ele!
(Malu quase chorando)
_ Ai, o que é que eu faço? Nem gozar eu tô conseguindo mais!
_ Olha amiga, eu sou uma mulher simples, de hábitos meio antigos, sabe? Eu sempre quis ter um marido que fosse bom, só isto. E você, afinal, o que espera de um companheiro?
_ Acho que nada demais. Apenas o que uma mulher moderna deseja... Sabe, o que eu leio nas revistas: um homem jovem, com um ótimo emprego, estabilizado, carinhoso, fiel, romântico, que goste de música eletrônica e que cozinhe pra mim.
_ Pobrezinha! Isto não é um homem, é uma máquina que ainda não inventaram! Já pensou no trabalho pra manter uma máquina destas? Agora entendo porque você não tá gozando... Tô achando que esta sua modernidade toda só tá te causando angústia...
_ Sara, sabe que você tem razão! Vou queimar todos os meus livros de auto-ajuda e revistas, e vou fundar uma nova seita, a da "Descomplicação"!

20 janeiro 2007

Porque eu gosto de editoriais...

Sábios Titãs, quando disseram que a tv nos deixa burros, burros demais!
8:00 h, Boa Noite, está começando mais um Jornal Nacional. Nele, as notícias serão despejadas em você como uma avalanche de imagens e dados, e num tempo bem acelerado, pra que no final seu cérebro não tenha muitas condições de analisar cada uma das notícias, nem perguntar o “porquê disso?”, nem de vincular causas e conseqüências, nem de estabelecer o que é verdade e o que é manipulação, e muito menos de ter condições de tirar lições para a vida. E com isto achamos que estamos bem informados, sabemos de todos os acontecimentos do mundo, mas quando precisamos dar uma opinião, “_Hã?!?...”
Qual é sua opinião sobre a eutanásia? E a liberação da maconha? Estas perguntas todo o mundo consegue responder. Mas se você vai mais a fundo, e pergunta: “_E porque você é contra? Ou "Porque é a favor"?” Aí o bicho pega... A maioria das pessoas não tem argumentos pra defender suas opiniões, que geralmente estão alicerçadas pelo que viram na tv. É o fast food da informação!
Lembro-me daquele referendo sobre desarmamento: eram tantas estatísticas a favor e contra, que era fácil para um indeciso chegar ao final do programa do “Sim” e dizer, puxa, é claro que é sim, e este mesmo indivíduo após ver o programa do “Não” concluir que o voto correto é do não.
Se NÂO pararmos pra pensar sobre, debater, contra argumentar e exercitar o raciocínio, só enxergaremos os números, os dados, os gráficos e -me desculpem os estatísticos- mas dados jogados ao léu sem um contexto bem caracterizado pode transformar mentiras em verdades e vice-versa.
Por isto, na minha segura opinião, nada substitui bom e velho jornal e seus editoriais. Lá há espaço para discussões, opiniões e seres pensantes. Mas também não adianta se você for adepto de fazer leitura dinâmica do periódico enquanto come um sanduíche nos 20 minutos que tira pra almoçar.
Há que se ler com calma, assim como há que se comer saboreando, sentindo a temperatura, a textura e o tempero. Para se beber um bom vinho não é DEVER ter conhecimento, mas é LÍCITO ter sensibilidade para sentir a cor, o aroma, e as tantas sensações gustativas que esta bebida nos desperta, ou do contrário estaremos maculando a arte de quem o produziu. Assim como fazer amor deve ter também seus slow motions, seus momentos de parar só pra sentir o cheiro, o calor do corpo e de se deliciar ao pensar que você está com AQUELA! pessoa.
O que você quer ser na vida? Que impressões quer deixar? Na Era dos Descartáveis, não dá pra viver sem eles, mas eu prefiro analisar meia dúzia de acontecimentos que ter um congestionamento de imagens inúteis na cabeça.

07 janeiro 2007

Resoluções de Ano Novo

Pois é, caros... em 2006 este blog ficou restrito ao meu conhecimento e ao do meu bem, apenas porque percebi que não tinha tempo pra atualizá-lo como gostaria.
Bem, imagine um blog que só tem postagens de ano em ano? Resolvi, então, que vou divulgar o blog como forma de me forçar a atualizá-lo com freqüência.
Todo mundo sabe que resoluções de Ano Novo nunca se concretizam... mas eu prometo que vou fazer o possível!
Gostaria ainda, de dizer, que este blog não é autobiográfico e, vez ou outra irei postar umas histórias que não necessariamente expressam minha opinião. Aliás, já digo de cara que este blog é para ser lido por pessoas "oppenminded". Nada contra qualquer tipo de posição ideológica, religiosa ou comportamental. Só acho que, como diz a Denise, quem não se identificar, não precisa voltar... mas quem gostar, por favor, volte e opine, it´s very important!